Meditações Existenciais: O Mito de Sísifo e o Sentido da Vida
O Mito de Sísifo e o Sentido da Vida
Uma Abordagem do Niilismo Existencial em Camus e Sartre
Uma Abordagem do Niilismo Existencial em Camus e Sartre
Quando o mundo finalmente arrancou de si os grilhões da religião, o homem procurou entender a razão de sua existência sem fazer referência a Deus. No entanto, as respostas alcançadas nos remetem a um pesadelo sem igual: se é o universo o responsável pela nossa existência, eu e você somos um subproduto acidental da natureza, resultado de uma soma de matéria, tempo e acaso. Não há razão alguma para que existamos e tudo o que nos espera é a morte. Em nossas mentes, tínhamos que, ao livrar-nos de Deus, também nos livraríamos de tudo aquilo que nos reprimia e coibia. Em vez disso, descobrimos da pior maneira que, ao matarmos Deus, também matamos a nós mesmos. Se não há Deus, a nossa vida torna-se absurda. Se a morte está em pé com os braços abertos ao final da trilha da vida, qual é o objetivo da vida? Que significado supremo pode nos ser dado? Que importância real tem a nossa existência? Por que eu estou aqui? Quem sou eu? A verdade é que não faz nenhuma diferença.
Por mais que tentemos desesperadamente fugir dessa implacável e cruel indiferença, os muros do nosso castelo de ilusões construído a fim de maquilar a realidade são frágeis demais para nos proteger da face da verdade. Ela soa a nós como um terremoto: primeiro, as rachaduras envolvem por completo os pilares de nossa fortaleza, e, por mais que tentemos resistir, é inútil, pois, inevitavelmente, o nosso frágil castelo de ilusões desmoronará como uma torre de cartas diante da insensível verdade. Esta será, então, a morte de todo o sentido e significado que construímos, bem como o fim de toda nossa esperança. O amanhã será, portanto, aquele que nos aproxima da morte, o nosso último inimigo. Segundo Camus, nós vivemos como se não tivéssemos a certeza da morte, no entanto, uma vez despojados do romancismo comum, o mundo torna-se um estranho e desumano lugar, impossível de ser explicado pela racionalidade da ciência em favor do mundo. Ora, pois, por que devemos continuar a agir de maneira contraditória e irracional, nos escondendo em um castelo de ilusões, se estamos em busca da verdade?
Por mais que tentemos desesperadamente fugir dessa implacável e cruel indiferença, os muros do nosso castelo de ilusões construído a fim de maquilar a realidade são frágeis demais para nos proteger da face da verdade. Ela soa a nós como um terremoto: primeiro, as rachaduras envolvem por completo os pilares de nossa fortaleza, e, por mais que tentemos resistir, é inútil, pois, inevitavelmente, o nosso frágil castelo de ilusões desmoronará como uma torre de cartas diante da insensível verdade. Esta será, então, a morte de todo o sentido e significado que construímos, bem como o fim de toda nossa esperança. O amanhã será, portanto, aquele que nos aproxima da morte, o nosso último inimigo. Segundo Camus, nós vivemos como se não tivéssemos a certeza da morte, no entanto, uma vez despojados do romancismo comum, o mundo torna-se um estranho e desumano lugar, impossível de ser explicado pela racionalidade da ciência em favor do mundo. Ora, pois, por que devemos continuar a agir de maneira contraditória e irracional, nos escondendo em um castelo de ilusões, se estamos em busca da verdade?
Não há como fugir: a humanidade é uma espécie condenada à destruição num universo em um processo lento e doloroso de morte. Uma vez que a humanidade deixará finalmente de existir, não faz nenhuma diferença se ela algum dia realmente existiu. A humanidade é, portanto, não mais importante do que um enxame de mosquitos ou uma manada de porcos, pois o fim de todos eles é o mesmo. Esse mesmo processo cósmico cego que nos lançou à existência, no final, nos engolirá de novo totalmente. Logo, a pessoa a quem chamamos de “eu” deixará de existir, não será mais. Poucos, entre nós, contempla a morte com a devida sinceridade. Nós apenas e simplesmente crescemos aceitando o fato. No entanto, a perspectiva da morte e a ameaça da inexistência nos espreita. Sartre havia percebido que a morte não é ameaçadora desde que a vejamos como a morte do outro, ou seja, do ponto de vista da terceira pessoa. É somente quando a internalizamos e a olhamos da perspectiva da primeira pessoa - “minha morte: eu vou morrer” - que a ameaça do não ser torna-se, então, real. Nos é evidente, portanto, que a importância existencial verdadeira de nossa morte só pode ser contemplada na perspectiva da primeira pessoa, quando compreendemos que iremos finalmente deixar de existir para sempre. Aqui, percebemos, então, que a vida é tão somente uma transição momentânea do esquecimento para o esquecimento.
E o que falar dos portadores de doenças congênitas e deficientes? Quer gostemos ou não, eles não passam de efeitos colaterais de um processo evolucionário cego que não se importa com vidas individuais. São meros produtos malsucedidos da mutação genética que, provavelmente, irão morrer antes que os outros. Nada são, frente uma cega, cruel e impiedosa indiferença postulada por um universo sem valor e sem sentido. O DNA não se importa. O DNA simplesmente é. Aqui tem-se a aniquilação de todos os valores e convicções humanas. Há somente a desvalorização e a morte de todo o sentido mundano, de todo propósito, de toda finalidade e de todas as respostas aos "porquês". Os valores tradicionais se colapsam e os princípios e critérios absolutos dissolvem-se diante do nada. A superfície, antes congelada, das verdades universais e dos valores tradicionais está despedaçada e torna-se difícil prosseguir no caminho ou avistar um alicerce. Não há suporte algum para as nossas pernas, e tampouco há alguém para nos segurar diante de uma iminente queda. A única coisa que nos faz companhia durante essa queda no abismo existencial é o nada, e é justamente no nada que a morte anda de mãos dadas com o fim absoluto. Esta é uma visão honesta e imparcial da realidade natural, a qual o próprio Shakespeare brilhantemente traduziu em sua obra MacBeth:
“Apaga-te, apaga-te, chama breve! A vida é apenas uma sombra ambulante, um pobre ator que por uma hora se espavona e se agita no palco, sem que depois seja ouvido; é uma história contada por idiotas, cheia de fúria e barulho, que nada significa.”
E o que falar dos portadores de doenças congênitas e deficientes? Quer gostemos ou não, eles não passam de efeitos colaterais de um processo evolucionário cego que não se importa com vidas individuais. São meros produtos malsucedidos da mutação genética que, provavelmente, irão morrer antes que os outros. Nada são, frente uma cega, cruel e impiedosa indiferença postulada por um universo sem valor e sem sentido. O DNA não se importa. O DNA simplesmente é. Aqui tem-se a aniquilação de todos os valores e convicções humanas. Há somente a desvalorização e a morte de todo o sentido mundano, de todo propósito, de toda finalidade e de todas as respostas aos "porquês". Os valores tradicionais se colapsam e os princípios e critérios absolutos dissolvem-se diante do nada. A superfície, antes congelada, das verdades universais e dos valores tradicionais está despedaçada e torna-se difícil prosseguir no caminho ou avistar um alicerce. Não há suporte algum para as nossas pernas, e tampouco há alguém para nos segurar diante de uma iminente queda. A única coisa que nos faz companhia durante essa queda no abismo existencial é o nada, e é justamente no nada que a morte anda de mãos dadas com o fim absoluto. Esta é uma visão honesta e imparcial da realidade natural, a qual o próprio Shakespeare brilhantemente traduziu em sua obra MacBeth:
“Apaga-te, apaga-te, chama breve! A vida é apenas uma sombra ambulante, um pobre ator que por uma hora se espavona e se agita no palco, sem que depois seja ouvido; é uma história contada por idiotas, cheia de fúria e barulho, que nada significa.”
Macbeth
Aos olhos da astronomia, observamos calmamente o expandir do universo. Com um olhar mais atento, é possível perceber que, conforme os ponteiros do relógio giram, ele vai se tornando cada vez mais frio, ao passo que sua energia vai sendo utilizada. Eventualmente, todas as estrelas irão se reduzir às cinzas e toda a matéria vai entrar em colapso, resultando em um grande cemitério de corpos celestes e enormes buracos negros. Não haverá luz, não haverá calor e não haverá vida, restando apenas os corpos de estrelas mortas e galáxias se expandindo na escuridão interminável de um espaço sem calor. No fim, seríamos apenas pedaços de carne que interagem entre si e têm reações químicas no corpo. Em outras palavras, nós servimos apenas para propagar DNA. Ora pois, se nós, meros sacos de uma sopa primordial reorganizada, decidimos assassinar um semelhante, o que é o assassinato senão um saco de compostos químicos impactando outro saco de compostos químicos? O que é o estupro senão um saco de compostos químicos despejando seu material genético em outro saco de compostos químicos?
Nesse cenário desesperador e cruel, valores morais não passam de expressões de gosto pessoal ou de subprodutos da evolução biológica. Em mundo sem um legislador moral que sirva como um parâmetro objetivo para as nossas ações, por que razão acharíamos que temos obrigações morais para fazer qualquer coisa? Quem deve dizer quais valores são certos e quais são errados? Quem deve dizer o que é bom e o que é mau? Quem deve julgar que os valores de Adolf Hitler são inferiores aos valores de Madre Tereza? Se não há Deus, tudo o que nos resta são nossos julgamentos subjetivos, culturais e gostos pessoais. Isso significa que é impossível condenar como maus a guerra, o estupro ou o assassinato. Do mesmo modo, não é possível enaltecer como bons a fraternidade, a igualdade e o amor. Ora, pois, se um estuprador tem em si que violentar uma criança é algo bom, o que torna nossa opinião mais válida que a dele? Em conclusão, ninguém, nestas circunstâncias, poderia ser moralmente condenado ou louvado por nada, pois não há moral. Tudo o que há são opiniões indiferentes acerca dos fatos nus e sem valor da existência.
No nada, repousam todos os nossos sonhos e esperanças. Nós somos meros acidentes do acaso, empurrados na existência sem razão alguma. Todos nós não passamos de um bocado de lodo que evoluiu racionalmente. Se Deus não existe, somos um aborto da natureza, lançados num universo despropositado para viver uma vida sem propósito. A conclusão, mais uma vez, nos desafia. Se Deus está morto, nós também estamos. Assim como Nietzsche, nos perguntemos: como nós, assassinos de todos os assassinos, consolaremos a nós mesmos? Assim como Sísifo, vivenciamos uma punição eterna. Todas as manhãs, cada um de nós levanta da cama para empurrar uma pesada rocha até o topo de uma montanha, para que, em seguida a sua queda, possamos carregá-la até o topo de novo e de novo...
Por que, embora reconheçamos a falta de sentido em nossas vidas, continuamos executando essa tarefa? Se todos nós seremos extintos na morte térmica do universo, então, em última análise, nada importa. Não importa o que fazemos ou como vivemos. Não importa se eu vivi como Hitler ou Madre Teresa. Não importa se eu sacrifiquei minha vida pela pessoa que amo. Não importa se fui rico ou pobre. Não importa se eu completei o meu álbum de figurinhas. Tudo acabará no mesmo estado escuro, frio e sem vida. Ora, não é que as coisas tenham perdido valor ao longo do tempo, mas que nunca foram, em última análise, significativas para começo de conversa. O tempo só serve para nos dar a perspectiva de ver que elas eram sem sentido o tempo todo. Tudo o que havia era a ilusão de valor. Não há razão para que continuemos a seguir em frente. Não há nada que possa preencher o vazio que é a nossa vida. Nós somos, portanto, desafiados a aceitar que não somos mais que um recipiente descartável. Acima de tudo, somos como prisioneiros condenados à morte, aguardando nossa execução inevitável pelas mãos de um universo sem propósito.
A devastadora consequência que nos assola, faz-nos lembrar de um conto ficcional onde um astronauta, abandonado em asteroide rochoso e estéril no espaço sideral, tinha consigo duas ampolas, uma com veneno e outra com uma poção que o faria viver para sempre. Compreendendo a sua situação terrível, com um único gole, sorveu o veneno. Mas depois, para seu horror, descobriu que tomara a ampola errada — havia bebido a poção da imortalidade, o que significava que estava amaldiçoado a existir para sempre, numa vida sem sentido e sem fim. Portanto, se Deus não existe, nossa vida é exatamente assim. Poderíamos ainda questionar a vida: “E daí?”. Daí, que não é apenas de imortalidade que o homem precisa. Se a vida não tiver nenhum significado maior; ele carece de Deus e de imortalidade. Se Deus não existe, o homem não tem nenhum dos dois. A obra, Esperando Godot, de Samuel Beckett, nos revela a angústia de nossas vidas: Durante toda essa peça teatral, dois homens conversam banalidades enquanto esperam chegar uma terceira pessoa, que nunca chega. Este é um retrato fiel de nossas vidas sem Deus. Estamos apenas matamos o tempo esperando - para quê? Bem... Não sabemos. Numa trágica descrição do homem, Beckett escreveu outra peça teatral em que as cortinas se abrem revelando um palco entulhado de lixo. Durante longos 30 segundos, a plateia silenciosa contempla toda aquela sujeira. Logo, o pano cai. É tudo. Isso é o homem: um lixo cósmico sem significado.
No romance A máquina do tempo, do escritor inglês H. G. Wells, a gravidade de nossa condição existencial fica, mais uma vez, em evidência. O viajante do tempo criado por Wells segue rumo ao futuro distante para descobrir o destino do homem. No entanto, tudo que encontra é uma terra morta, exceto por alguns liquens e musgos, orbitando em torno de um gigantesco sol vermelho. Os únicos sons que ecoam são o do vento soprando e a gentil ondulação do mar. O mundo estava em silêncio. Todos os sons produzidos pelo homem, o balido das ovelhas, o trilado das aves, o zumbido dos insetos, a agitação das cidades que compõe o cenário de nossa vida, tudo isso havia deixado de existir para sempre. E, assim, o viajante do tempo de Wells retornou. Mas voltou para onde? Bem... para um mero ponto anterior à corrida despropositada rumo ao esquecimento. Esse é o cenário inevitável e perturbador que enfrentamos. Se Deus não existe, a história da humanidade terminará exatamente assim, quer gostemos ou não. Não existe esperança; não existe escapatória; não existe propósito.
Todas as contribuições dos cientistas para avançar o conhecimento humano, as pesquisas dos médicos para aliviar a dor e o sofrimento, os esforços diplomáticos para assegurar a paz no mundo, todas as guerras mundiais e todo sangue derramado, os sacrifícios dos homens bons em todos os lugares para melhorar a condição humana, a luta pelo direito dos animais, os desmatamentos das florestas e a preservação do meio ambiente, tudo isso resulta em nada, um grande universo de nada. E, uma vez que ele termina em nada, o homem não é nada. Agora, visto que finalmente pudemos compreender que a vida não tem significado e que não há razão aparente para continuarmos, nos resta responder sinceramente aquilo que Camus chamou de a causa maior existencialista: será que a realização da plenitude e absurdo da vida exigem suicídio? Ora pois, se nós somos, de fato, seres racionais, não seria apropriado evitarmos toda a dor e sofrimento? Não seria sensato adiantar um resultado final já estabelecido? Afinal, mais irracional do que lutar contra uma vida absurda, é vivê-la. Este é o andar de baixo: um mundo finito, sem Deus, sem esperanças, sem julgamentos, sem propósitos e sem valor; um mundo de dores e pavores, onde a maior das dores é saber que sua vida não faz sentido. Sartre, em sua desconcertante obra Entre quatro paredes, já predizia a insignificância angustiante de nossa condição existencial. Ele retrata a vida como o inferno, onde a fala da última cena de sua obra nos soa como uma solução final: [...] pois é, vamos continuar?
Nesse cenário desesperador e cruel, valores morais não passam de expressões de gosto pessoal ou de subprodutos da evolução biológica. Em mundo sem um legislador moral que sirva como um parâmetro objetivo para as nossas ações, por que razão acharíamos que temos obrigações morais para fazer qualquer coisa? Quem deve dizer quais valores são certos e quais são errados? Quem deve dizer o que é bom e o que é mau? Quem deve julgar que os valores de Adolf Hitler são inferiores aos valores de Madre Tereza? Se não há Deus, tudo o que nos resta são nossos julgamentos subjetivos, culturais e gostos pessoais. Isso significa que é impossível condenar como maus a guerra, o estupro ou o assassinato. Do mesmo modo, não é possível enaltecer como bons a fraternidade, a igualdade e o amor. Ora, pois, se um estuprador tem em si que violentar uma criança é algo bom, o que torna nossa opinião mais válida que a dele? Em conclusão, ninguém, nestas circunstâncias, poderia ser moralmente condenado ou louvado por nada, pois não há moral. Tudo o que há são opiniões indiferentes acerca dos fatos nus e sem valor da existência.
No nada, repousam todos os nossos sonhos e esperanças. Nós somos meros acidentes do acaso, empurrados na existência sem razão alguma. Todos nós não passamos de um bocado de lodo que evoluiu racionalmente. Se Deus não existe, somos um aborto da natureza, lançados num universo despropositado para viver uma vida sem propósito. A conclusão, mais uma vez, nos desafia. Se Deus está morto, nós também estamos. Assim como Nietzsche, nos perguntemos: como nós, assassinos de todos os assassinos, consolaremos a nós mesmos? Assim como Sísifo, vivenciamos uma punição eterna. Todas as manhãs, cada um de nós levanta da cama para empurrar uma pesada rocha até o topo de uma montanha, para que, em seguida a sua queda, possamos carregá-la até o topo de novo e de novo...
Por que, embora reconheçamos a falta de sentido em nossas vidas, continuamos executando essa tarefa? Se todos nós seremos extintos na morte térmica do universo, então, em última análise, nada importa. Não importa o que fazemos ou como vivemos. Não importa se eu vivi como Hitler ou Madre Teresa. Não importa se eu sacrifiquei minha vida pela pessoa que amo. Não importa se fui rico ou pobre. Não importa se eu completei o meu álbum de figurinhas. Tudo acabará no mesmo estado escuro, frio e sem vida. Ora, não é que as coisas tenham perdido valor ao longo do tempo, mas que nunca foram, em última análise, significativas para começo de conversa. O tempo só serve para nos dar a perspectiva de ver que elas eram sem sentido o tempo todo. Tudo o que havia era a ilusão de valor. Não há razão para que continuemos a seguir em frente. Não há nada que possa preencher o vazio que é a nossa vida. Nós somos, portanto, desafiados a aceitar que não somos mais que um recipiente descartável. Acima de tudo, somos como prisioneiros condenados à morte, aguardando nossa execução inevitável pelas mãos de um universo sem propósito.
A devastadora consequência que nos assola, faz-nos lembrar de um conto ficcional onde um astronauta, abandonado em asteroide rochoso e estéril no espaço sideral, tinha consigo duas ampolas, uma com veneno e outra com uma poção que o faria viver para sempre. Compreendendo a sua situação terrível, com um único gole, sorveu o veneno. Mas depois, para seu horror, descobriu que tomara a ampola errada — havia bebido a poção da imortalidade, o que significava que estava amaldiçoado a existir para sempre, numa vida sem sentido e sem fim. Portanto, se Deus não existe, nossa vida é exatamente assim. Poderíamos ainda questionar a vida: “E daí?”. Daí, que não é apenas de imortalidade que o homem precisa. Se a vida não tiver nenhum significado maior; ele carece de Deus e de imortalidade. Se Deus não existe, o homem não tem nenhum dos dois. A obra, Esperando Godot, de Samuel Beckett, nos revela a angústia de nossas vidas: Durante toda essa peça teatral, dois homens conversam banalidades enquanto esperam chegar uma terceira pessoa, que nunca chega. Este é um retrato fiel de nossas vidas sem Deus. Estamos apenas matamos o tempo esperando - para quê? Bem... Não sabemos. Numa trágica descrição do homem, Beckett escreveu outra peça teatral em que as cortinas se abrem revelando um palco entulhado de lixo. Durante longos 30 segundos, a plateia silenciosa contempla toda aquela sujeira. Logo, o pano cai. É tudo. Isso é o homem: um lixo cósmico sem significado.
No romance A máquina do tempo, do escritor inglês H. G. Wells, a gravidade de nossa condição existencial fica, mais uma vez, em evidência. O viajante do tempo criado por Wells segue rumo ao futuro distante para descobrir o destino do homem. No entanto, tudo que encontra é uma terra morta, exceto por alguns liquens e musgos, orbitando em torno de um gigantesco sol vermelho. Os únicos sons que ecoam são o do vento soprando e a gentil ondulação do mar. O mundo estava em silêncio. Todos os sons produzidos pelo homem, o balido das ovelhas, o trilado das aves, o zumbido dos insetos, a agitação das cidades que compõe o cenário de nossa vida, tudo isso havia deixado de existir para sempre. E, assim, o viajante do tempo de Wells retornou. Mas voltou para onde? Bem... para um mero ponto anterior à corrida despropositada rumo ao esquecimento. Esse é o cenário inevitável e perturbador que enfrentamos. Se Deus não existe, a história da humanidade terminará exatamente assim, quer gostemos ou não. Não existe esperança; não existe escapatória; não existe propósito.
Todas as contribuições dos cientistas para avançar o conhecimento humano, as pesquisas dos médicos para aliviar a dor e o sofrimento, os esforços diplomáticos para assegurar a paz no mundo, todas as guerras mundiais e todo sangue derramado, os sacrifícios dos homens bons em todos os lugares para melhorar a condição humana, a luta pelo direito dos animais, os desmatamentos das florestas e a preservação do meio ambiente, tudo isso resulta em nada, um grande universo de nada. E, uma vez que ele termina em nada, o homem não é nada. Agora, visto que finalmente pudemos compreender que a vida não tem significado e que não há razão aparente para continuarmos, nos resta responder sinceramente aquilo que Camus chamou de a causa maior existencialista: será que a realização da plenitude e absurdo da vida exigem suicídio? Ora pois, se nós somos, de fato, seres racionais, não seria apropriado evitarmos toda a dor e sofrimento? Não seria sensato adiantar um resultado final já estabelecido? Afinal, mais irracional do que lutar contra uma vida absurda, é vivê-la. Este é o andar de baixo: um mundo finito, sem Deus, sem esperanças, sem julgamentos, sem propósitos e sem valor; um mundo de dores e pavores, onde a maior das dores é saber que sua vida não faz sentido. Sartre, em sua desconcertante obra Entre quatro paredes, já predizia a insignificância angustiante de nossa condição existencial. Ele retrata a vida como o inferno, onde a fala da última cena de sua obra nos soa como uma solução final: [...] pois é, vamos continuar?
Referências bibliográficas:
[1] O Mito de Sísifo - CAMUS, Albert;
[2] Entre quatro paredes - SARTRE, Jean-Paul;
[3] SHAKESPEARE, William - Macbeth;
[4] NIETZSCHE, Friedrich - Além do Bem e do Mal;
[5] H. G. Wells - A maquina do tempo;
[6] O Absurdo da vida sem Deus - CRAIG, William Lane;
[7] Imagem: Sísifo, de Tiziano, 1549;
Andrei S. Santos
Graduando em Antropologia pela Universidade Federal Fluminense
44 comentários
Andrei Santos, aqui quem fala é o Sá! De fato, estava na hora de Camus entrar na história! Putz, um ateu refutando neo ateus. As coisas eram mais conscientes antigamente!
ResponderExcluirOpa! Realmente, estava na hora! Eu gosto muito dos escritos de Camus e Sartre. É tudo muito fascinante. Eu gostaria que mais neo-ateus entendessem o que de fato seguem... Mas acredito que seja um sonho distante meu, dada a antirreligiosidade cega deles.
ExcluirIronicamente, essa característica presentes neles está totalmente relacionada a questões morais!
ExcluirDesaprovação de atos alheios...
http://m.youtube.com/watch?v=ytjYIxFSZRM
ExcluirChesterton já estava ciente desta situação pois o cético nunca crê que esteja errado pois nada é absolutamente certo para ele fora seus questionamentos e convicções pessoais
ExcluirEsse vídeo é sensacional!
ExcluirO argumento cosmológico Kalam tem como objetivo deduzir que a origem do universo se deve a uma causa externa necessariamente existente o qual chamamos de Deus, certo?
ExcluirE o argumento Leibniziano tem como objetivo deduzir que a explicação para a existência do universo é uma causa externa que chamamos de Deus, haja vista que o universo não tem em si uma completa razão de sua existência porque os elementos que o compõe são contingentes e finitos, certo?
Os princípios metafísicos em questão são estes:
Tudo que é contigente possui uma explicação para existir ao invés do contrário (inexistir).
Tudo que tem um início ou começo absoluto deve sua existência a uma causa externa preexistente.
Estes argumentos já foram refutados, Andrei Santos? Se não, poderia me dizer uma compilação das objeções aos argumentos acima, por favor?
Se há uma refutação objetiva, eu sinceramente nunca vi. Também não conheço um modo de refutar tais argumentos, pois me parecem bastante sólidos.
ExcluirEm suas próprias palavras como você dissertaria a respeito de ambos os argumentos?
ExcluirTalvez você tenha percebido que eu escrevi as premissas noutras palavras, gostaria que você fizesse o mesmo, ou seja, escrevesse um texto a respeito de ambos os argumentos e relacionando-os tal como fez em seu Dilema Moral do Ateísmo, pode ser?
Claro que você é atarefado, então, caso fizer, faça como fez com seu futuro livro, tá?
Por favor.
Sim, no futuro, farei como fiz com o o Dilema Moral do Ateísmo. Obrigado pela ideia.
ExcluirNão existe o vacuo absoluto, o que chamamos de nada é proque é o limite dos alicerces desta realidade, o acaso ou probabilidade. Deus é o tratamento de respeito e uma maneira de personificar, uma singularidade, onde todas as leis desta realidade colapsam. Ele é o suporte onde se fundamenta o existir, indecifrável. Tudo faz parte de um unico ser, uma união harmônica em que nada se perde, onde origem e fim se unem.
ResponderExcluirA ciência só descrobriu uma parte desta história alguns dos mistérios, como o que chamamos de Big Bang, transformando o virtual em vibrações, esta em energia, e energia em matéria.Tudo evolui minuciosamente desde o primeiro atomo, o hidrogênio, que foi se combinado nas fornalhas das estrelas para formarem atomos mais pesados e propiciando o aparecimento de milhares de planetas, que entraram no jogo de estatística para o aparecimento da vida, a Terra é um deles. Continuando a evolução da matéria em seres biológicos, evoluindo a consciência, primeiramente como mecanismo de sobrevivencia, de adaptação. Como somos mortais, a natureza criou o mecanismo da reprodução para não sermos extintos, e o resultado são os seres humanos que conseguem sobreviver a cataclismo.
O futuro é incerto, mais continuamos a evoluir, só que esta evolução foi criada pelo Homem, e é mais rápida, evoluçao tecnologica, atingindo no futuro a singularidade, criando a inteligência artificial.
Andrei vc chegou a ler sobre aquela tribo indigena sem qualquer religiosidade?
ResponderExcluirSe estiver se referindo aos Pirarrãs, sim.
ExcluirEles realmente são ateus? É sério isso?
ExcluirNão, são apenas céticos limitados pelas suas barreiras epistemológicas. Eles não acreditam em divindades ou algo do tipo, tampouco que o universo teve um começo, mas em contrapartida acreditam em espíritos menores que tomam formas materiais. Eles não acreditam em nada que não possam ver, isso inclui muitas coisas que estão momentaneamente fora de seu alcance, tal como átomos e elementos em escalas do tipo, invisíveis a olho nu.
ExcluirSe somos criaturas livres isso significa que Deus não obriga ou força alguém a obedecer suas leis então temos responsabilidade perante nossas escolhas não é verdade?
ExcluirExatamente.
ExcluirEsse texto ilustra bem a diferença da análise ateísta para a religiosa. Na religiosa, a explicação escolhida é a mais confortável, aquela que nos faz sentir importantes e amados.
ResponderExcluirA realidade ateísta é aquela que se adequa às evidências. O fato de alguém se sentir triste com a perspectiva de que não há um plano maior para a vida não tem (ou não deveria ter) relevância na busca pela verdade.
Dizer uma criança que acaba de perder os pais que eles viajaram ao invés de que morreram pode ser mais agradável para a pequena órfã, mas não muda a realidade em uma vírgula que seja.
Do mesmo modo, se dizer ateu e apelar para conceitos como justiça, dignidade, bem e mal também demonstra a maquiagem refletida por Schaeffer.
ExcluirApelar em que sentido? O que ateísmo tem a ver com justiça, dignidade ou bem e mal?
ExcluirO ateísmo nada, mas volta e meia vejo ateus apelando para conceitos como justiça, dignidade, bem e mal, mesmo não tendo o direito. A cosmovisão naturalista é moralmente neutra e não possui qualquer significado maior. Valores morais, nesse cenário, são ilusórios.
ExcluirA natureza em si é amoral levando em consideração as implicações lógicas do ateísmo. O ateísmo em si é insuportável, digo por mim, pois terás de abdicar de várias coisas que são crenças epistemológicas básicas. Isso é quase impossível de se fazer.
ExcluirDe fato, sou obrigado a concordar.
ExcluirA questão é que dizer que "volta e meia vejo ateus apelando..." nada tem a ver com a falta de base no seu argumento e me faz pensar que você está tentando desviar o foco do meu quesstionamento. Eu apontei que o fato de você achar difícil ou desagradável, nada tem a ver com a veracidade dos fatos. O que você está dizendo é que escolhe suas crenças baseadas em conforto?
ExcluirMeu caro, estamos dizendo que se valores morais objetivos não existem (se o Bem e o Mal realmente não existem) então, qual o sentido de julgar as ações dos demais? Se tudo se resume a um parecer pessoal (opinião) logicamente você faz o que quiser independente das pessoas gostarem ou não. Não importa o quão inconveniente suas ações forem, por exemplo, a conduta de psicopatas.
ExcluirNão disso que texto fala não. Acho melhor você ler de novo.
ExcluirSe não faz sentido julgar a conduta dos outros, se o Bem e o Mal são ilusões ou somos condicionados a acreditar que eles são reais, então devemos concluir que não há condenação tampouco louvor pelas ações humanas. Todas as ações humanas são moralmente neutras ou amorais. O ser humano é um ser iludido com delírios de grandeza ou importância se, e SOMENTE se, o ateísmo possuir um valor de verdade a respeito dos valores/princípios/virtudes no mundo.
ExcluirMas respondendo sua pergunta: Sim, o ateísmo possui algo a ver a respeito dos valores morais, este "algo a ver" é sua implicação lógica de não poder sustentar a existência dos valores. Por quê? Simples, sem Deus (considere Deus como um fundamento fixo e imutável) para os valores serem válidos e obrigatórios não importando inferências humanas a respeito, se este fundamento não existe. Os valores perdem sua significância sendo reduzidos a meras opiniões que "colaram".
ExcluirA questão é que essa reflexão não tem nenhum impacto sobre o fato concreto de ser verdadeira ou não. O fato de alguém estar com câncer é um fato terrível, quer ele aceite essa verdade ou não. Se alguém se nega a aceitar que está com câncer por acreditar que se estiver com câncer a vida perde o sentido em que mudará o fato dele estar efetivamente doente?
ExcluirOs valores morais seriam apenas um consenso social para o (com a finalidade subjetiva) convívio harmonioso entre seres humanos, mas se os valores morais não são nada mais que isso, então, com qual razão teríamos de condenar quem discorda do consenso? Opinião? Meu caro, todo mundo tem isso.
ExcluirMas faria diferença esse alguém estar doente? Se todos vamos morrer, por quê querer evitar o inevitável? Sabe, não faz muito sentido? Se o universo não tem propósito o homem também não.
ExcluirO ser humano faz parte do conjunto universo e não o contrário. Ambos não possuem razão de existir caso o ateísmo for verdadeiro como visão de mundo. Em tempo, o universo não faz parte do conjunto ser humano (O ser humano criar um valor pro universo não fará este último automaticamente possuir valor). Em tempo, se o ateísmo for verdadeiro, a coisa mais ilógica a se fazer a respeito disto é se meter na vida dos outros, haja vista uma moralidade subjetiva, isto é, uma moralidade equiparável a meros gostos pessoais.
ExcluirOu seja, você confirmou meu primeiro comentário. Para você, o importante é que as coisas tenham um sentido maior e não que sejam reais.
ExcluirPenso exatamente o contrário. O importante é que enxerguemos a realidade e não nos iludir achando que possuímos valor se e somente se o ateísmo é verdadeiro.
ExcluirSó para diferenciar: você pode ser moral sem crer num Deus mas depende de sua existência para que a moralidade possua valor.
ExcluirMuito bom, Anônimo. Boas respostas. Estou acompanhando o debate de vocês.
ExcluirSe a verdade é importante, que importância tem o fato de algo ter um sentido maior ou não?
ExcluirA questão não é a origem dá moral, que é trivial, mas a questão clara de que o post diz que "sem Deus, as coisas não tem um sentido maior", porém isso é irrelevante na questão de qual é a verdade. O ponto, que você insiste em desviar, é que as coisas são verdadeiras ou falsas independentemente do quão legais e interessantes podem parecer. Você pode olhar para as estrelas e imaginar que são os grandes reis do passado (citação a Rei Leão) e encontrar conforto nisso, no entanto não torna essa possibilidade real.
Mano,sou eu, o Sá!
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirO ateísmo não pode responder as questões do fundamento dos valores morais. Qual a explicação para a realidade dos valores, esta é a questão.
ResponderExcluirExatamente. O ateísmo não pode explicar a realidade dos valores morais objetivos. Se eles são verdadeiros, logo, devem ser fundamentados em algo externo ao ser humano.
ExcluirPois é! "Achar" se distingue de "Ser". Muitos acham que possuem valor, mas valor, por definição, necessita de uma causa externa. A essência dos valores não pode estar fundamentado na opinião humana tampouco no bem estar dos mesmos! Por quê? Simples, as opiniões de entes pensantes tendem a ser contraditórias, então quem está certo e errado? Aqueles que usam do consenso?
ResponderExcluirMuito bem colocado. Excelente!
ExcluirReligiões humanistas seculares, como evolução, ateísmo e agnosticismo são parte integrante do mesmo sistema de CRENÇAS.
ResponderExcluirEssas visões de mundo reinam livremente com dólares suportados por impostos não apenas nos Estados Unidos, mas também no Reino Unido, Austrália, Alemanha e muito ouros países.
É irônico que sob o grito de guerra "vamos manter a religião fora" da arena pública, os secularistas expulsaram o cristianismo da sala de aula e o substituíram por outra religião: a religião do naturalismo, que o ATEÍSMO.
Maravilhoso artigo! Sensacional! Parabéns!